2 de junho de 2010

"Os caminhos para Deus"


Em seu livro "O que faz do brasil, Brasil", Roberto DaMatta explora diversos aspectos da cultura brasileira, para tentar definir o Brasileiro. No capítulo entitulado "Os caminhos para Deus", aponta ironicamente as formas como os brasileiros se comunicam com Deus, santos e o "outro mundo".
Segundo ele, há uma necessidade de se acreditar em algo superior, em algo maior que nós, e essa seria uma maneira de entender o mundo, entender as diferenças, o porquê de tantos infortúnios, tanta dor. E, ao mesmo tempo, suplicar que Deus ilumine a Terra e dê forças aos mortais. Nesse caso, a religião serviria para explicar, para questionar e responder.
Para compartilhar tudo que a religião nos oferece, temos a Igreja, uma entidade puramente santa, onde as pessoas se reúnem para venerar o mesmo Deus e os mesmos santos, para comungar o corpo de Cristo e entoar preces, que quanto mais fortes e cheias de adornos, mais rápido chegam aos ouvidos do Criador. É também a Igreja, o local onde batizamos nossos filhos, onde casamos, selando assim, laços eternos com a família e com Deus.
Há no Brasil uma variedade infinita de religiões, cada uma com suas tradições, cultos e diferentes formas de veneração. Todas têm como foco a idéia de que existe uma relação entre nós, seres humanos mortais, e os deuses; a possibilidade de comunicação com esse outro mundo, no qual não teríamos mais problems, nem dores, angústias e onde estaríamos lado a lado com Deus.
O brasileiro, como já sabemos, acha que a solução de seus problemas está bem acima de nós, nas mãos de Deus e seus "ajudantes celestiais", daí vem a intimidade que as pessoas têm com os santos. Cada um é devoto de um santo, seja ele o casamenteiro, o das causas urgentes, das impossíveis ou aquele que nos ajuda a encontrar objetos perdidos. Creio que todo esse folclore que se criou em torno desses mártires, não é à toa, pois eles foram pessoas normais, igual a qualquer um de nós, e que dedicaram sua vida para fazer o bem, servir a Deus... como, então, não amá-los? Além disso, os santos são as divindades que acreditamos estarem mais perto de nós, mais "acessíveis". São representantes desse mundo e do outro, nossos protetores. Ter uma gruta no jardim de casa é estar protegido. Ter uma santa ceia na parede da sala é uma maneira de demonstrar que na sua casa não há espaço para o Satanás. O que ninguém admite, mas todo mundo sabe, é que o inferno é aqui mesmo, na Terra. E que, mesmo sua casa estando cheia de santos e bíblias, sem uma cerca elétrica no portão e um pit-bull de segurança, não se vive em paz.
Para DaMatta são muitas as formas de se chegar a Deus, o que não deixa de ser verdade, levando em conta tudo que vemos e vivenciamos na nossa cultura. Ninguém é totalmente descrente de que existe sim, uma entidade superior, que nos guia e ilumina. Mas vamos ser honestos com nós mesmos: Deus deve estar cansado de nós. Pois ao fazer o homem à sua imagem e semelhança, pensava estar criando um poço de sensibilidade e amor. O que não ocorreu, como podemos constatar... Precisamos de dinheiro para quitar algumas dívidas: Deus devia ter criado a árvore do dinheiro. Precisamos de companhia: acenda velas à Santo Antônio. E assim, sempre que algo nos falta, recorremos ao Todo Poderoso.
No último parágrafo, DaMatta resume o capítulo todo em poucas e sábias palavras, ao dizer que o brasileiro acredita num outro mundo, onde tudo seria possível, e onde tudo que aqui na Terra não funciona, passa a funcionar, como a lei do retorno: faça o bem para colher o bem. Ou seja, vivemos uma vida de sofrimento e desalento, mas isso não nos faz desacreditar que tudo dará certo, mesmo sendo após a morte. É uma esperança, mesmo que vã. O céu à brasileira está a nossa espera, rezemos então, para que seja mesmo um lugar assim tão mágico, capaz de exterminar os problemas e as dores das pessoas, caso contrário, a decepção será tamanha, que Deus vai ser chutado do "Paraíso".



Ana Paula Miola.

2 comentários:

  1. Legal seu texto e blog.
    Tem um outro livro do DaMatta, "Carnavais, Malandros e Heróis", que meio que complementa isto que ele disse sobre o Deus à Brasileira: se precisamos lançar aos céus as resoluções de nossos problemas, aqui na terra, segundo DaMatta, os brasileiros são incapazes de respeitar as leis e assimilar o que quer que seja de normas institucionais...; é claro que é cultural, mas o legal é quando ele diz que o brasileiro, frente a qualquer norma, diz: "Você sabe com quem está falando?". É um jargão à brasileira, como qualquer divindade, segundo DaMatta...

    Gostei de seu blog.
    Comentarei mais.

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